Populismo: o bebé que chora por tudo e por nada

21-12-2019

Crónica por João Pedro Canário

Associado frequentemente aos extremismos tem sido subestimada constantemente a sua existência na sociedade portuguesa, fingindo e aligeirando que as principais forças políticas populistas não são na nação da extrema-esquerda: o PCP e o Bloco de esquerda e na fação da extrema-direita: o PNR - Partido Nacional Renovador - e, o recém-chegado CHEGA.

Muitos dizem ser uma forma de fazer política, outros apregoam ser uma ideologia, quando no fundo esta apenas se serve delas para atingir o seu propósito e aí prefixo muda e dá lugar ao oportunismo. Onde uns vêem defeitos, outros apenas conseguem ver qualidades. Todas as rosas têm os seus espinhos, mas existe sempre alguém que goste de agarrá-los para não os ver. Sendo então factual que cada vez mais pessoas se deixam seduzir pelo tom encantatório altamente dissimulado dos discursos populistas. Veja-se que quem quer enganar, encontra sempre alguém para ser enganado.

Para captar a atenção dos incautos, os populistas baseiam o seu discurso maioritariamente em: boatos, meias-verdades ou até mesmo mentiras - as designadas de "fake news" - já amplamente disseminados pelas redes sociais e acentuam a sua gravidade, deturpando dessa forma a verdade para serem vistos como os arautos implacáveis de toda uma hipotética verdade que não pode ser tolerada. Desinformação pura. Querem fazer crer que as exceções constituem a regra, generalizando tudo com o qual se deparam. Rara ou nula a vez em que são fiéis aos factos. Nem pretendem sê-lo, caso contrário não conseguem cativar o seu potencial eleitorado. Não se dão bem com a verdade, de tal forma que acreditam nas suas próprias mentiras. Mitomania crónica.

Concretamente, um populista pinta a realidade pelo seu lado obscuro. Reescreve a história sob a perspetiva do vilão. Multiplica a desgraça. Apregoa ser o volte-face da moeda que vai reverter essa situação. No entanto, apenas identifica os problemas e não lhes destina soluções exequíveis. Esta é a raiz do mal. Os seus líderes autossatisfazem-se a elaborar discursos, quando no fundo são incapazes de resolver um único problema. São especialistas em coisa nenhuma. Tem uma mão cheia de nada e outra de coisa nenhuma para dar o que quer que seja. É o auge da demagogia. Demagogia em bruto. Deliberadamente lapidada para um certo público alvo. Todos aqueles que consideram que problemas complexos se resolvem com soluções simplistas.

Por vezes surge até a falácia por parte dos "suspeitos do costume" de que o populismo de esquerda combate o de direita. Ninguém se quer capacitar que tudo isto não passa de uma autêntica farsa. Não existe populismo bom ou mau, ambos são nefastos para a sociedade. O populismo é uma praga que depois de se instalar, só demove os seus fanáticos quando esses passam a ser oprimidos.

Está comprovado que em países onde o populismo floresce e acaba por assumir as rédeas do poder, o índice de democracia começa a descer abruptamente até se transformar num regime não-democrático. Captando o poder exercem a sua hegemonia de modo a diminuir a atuação da tripartição de poderes, viciam resultados eleitorais, aniquilam a atuação da oposição - vêem no adversário um inimigo a abater, são avessos ao debate construtivo - e, manipulam/omitem grande parte da informação veiculada nos meios de comunicação social. A verdade com a qual a sociedade se depara é apenas aquela que é mostrada. Um autêntico policiamento do pensamento. O que é certo e chega até a ser caricato são os meios de comunicação social que andam com os populistas ao colo para conseguir ter audiência, chegará o dia em que já não vão aguentar com o bebé.

No contexto internacional, os exemplos estão cada vez mais à vista: a Coreia do Norte, China e Venezuela associadas a ditaduras de extrema-esquerda e no limiar de uma ditadura de extrema-direita: Brasil e EUA considerados, para já, proto-fascismos que a longo prazo se transformarão, efetivamente, num regime não-democrático.

Deixemo-nos de uma vez por todas de acreditar nas falácias destes profetas da desgraça, que para além de não resolverem nada do que se propõe a fazer, apenas se transformam num líder pior do que aquele que criticavam. Estes falsos salvadores da pátria propõem-se a erradicar os principais cancros da democracia - corrupção instalada, o nepotismo, os constantes abusos de poder e por conseguinte a ineficácia do sistema judicial na aplicação de sanções -, quando no fundo só ocultam o problema ao invés de o solucionar aplicando severas sanções. O discurso anti-elite é caduca, só dura até alcançarem o que pretendem. Só pertencem ao povo até esse momento. Alcançado o objetivo pretendido transformam-se na nova elite. Quer se queira, ou não, o poder será sempre um cemitério de elites. É irrefutável. Quando uma sai de cena, desde logo, surge outra para a substituir.

Goste-se ou não, sem a intervenção de partidos políticos no espaço público mediático não existe democracia. A solução para a atual crise de representatividade da democracia portuguesa jamais se resolve apostando num governo ao comando de um líder populista, mas sim em novos representantes com habilitações, noções democráticas e cientes do compromisso de honestidade que tem de assumir para com os seus governados. Temos de voltar a ser inundados por estadistas que defendam medidas concretas e exequíveis, que prezem a união e não a normalização do ódio.

Não precisamos nem de um, nem de dois Salazares como muitos apregoam. Os filhos da democracia sabem lá o que estão a dizer. E para os que andam por aí tão saudosos dessa individualidade, só existe uma maneira de ir ter com ele...

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